Na tarde desta quarta-feira, 27 de setembro, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal aprovou, por 16 votos a favor e 10 contrários, o Projeto de Lei (PL) 2.903/2023, que propõe o estabelecimento do marco temporal para a demarcação de terras indígenas. O projeto, que tem gerado intensos debates e controvérsias, determina que os povos indígenas terão direito ao usufruto exclusivo apenas das terras que já ocupavam ou reivindicavam em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal vigente.
A votação aconteceu após mais de quatro horas de discussões acaloradas entre os membros da comissão. Além de aprovar o texto do PL, os parlamentares também decidiram que o projeto será encaminhado ao Plenário do Senado em regime de urgência.
A aprovação do PL 2.903/2023 ocorre uma semana após uma decisão polêmica do Supremo Tribunal Federal (STF), que por 9 votos a 2, considerou inconstitucional a limitação do direito de comunidades indígenas ao usufruto exclusivo das terras com base na data de promulgação da Constituição Federal.
Nesta quarta-feira, o STF retomou a análise de outros aspectos relacionados à demarcação de terras indígenas, como a possibilidade de indenização a particulares que adquiriram terras em áreas reivindicadas por povos indígenas, e se o pagamento seria condicionado à desocupação das áreas pelos proprietários.
O PL 2.903/2023, que engloba o marco temporal e outras questões semelhantes às discutidas no STF, dividiu opiniões entre os senadores. Aqueles favoráveis ao projeto argumentam que a decisão do STF não retira do Congresso Nacional a competência de legislar sobre o tema.
“É importante lembrar que a Constituição Federal é muito clara em relação às competências do STF e do Poder Legislativo. Não podemos aceitar o argumento de que o Congresso está desafiando uma decisão do STF”, comentou o senador Marcos Rogério (PL-RO), relator do PL 2.903 na CCJ.
Por outro lado, os parlamentares contrários ao marco temporal criticaram a legalidade da proposta aprovada. “É preocupante a persistência da CCJ do Senado em legislar com entendimento contrário à decisão do STF com repercussão geral. Isso parece não fazer sentido em um projeto de lei. Faria mais sentido se fosse uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC)”, ressaltou o senador Alessandro Vieira (MDB-SE), acrescentando que muitos acreditam que a iniciativa será invalidada pelo Poder Judiciário.
Antes da votação do PL, o senador Marcos Rogério apresentou seu parecer sobre as 49 emendas apresentadas ao projeto original, recomendando a rejeição de todas elas. Entre as emendas, uma delas tentava reverter a autorização para o cultivo de organismos geneticamente modificados em terras indígenas, enquanto outra buscava restringir o contato com povos isolados apenas a prestadores de auxílio médico em casos de risco iminente.
Rogério também defendeu a possibilidade de comunidades indígenas explorarem o turismo em seus territórios, argumentando que isso é respaldado pela doutrina especializada em direito indígena.
No entanto, a senadora Eliziane Gama (PSD-MA), contrária ao PL, criticou o texto aprovado pela CCJ, argumentando que ele prejudica os povos indígenas, especialmente aqueles em situação de isolamento, ao permitir o acesso sem critério de saúde pública e premiar a ocupação irregular de territórios tradicionais. Ela alertou que o projeto pode agravar os conflitos fundiários e aumentar a violência contra os povos indígenas no Brasil.